Edson de França*
Circula pelas redes uma expressão muito
significativa. “Nunca se escreveu tanto,
tão errado e se interpretou tão mal”. Assunto a se pensar bem nos tempos
que nos veem passar.
Os humanos depois que dominaram a arte
ou a habilidade não pararam mais, de falar, digo. E nesse particular, o
brasileiro médio exibe toda sua destreza, sempre que aparece uma oportunidade.
Dizem que por uma ancestralidade latina, o dito cujo é chegado mais a fala que
à escrita. Nossas línguas, naturalmente, não silenciam nunca.
Gostamos de nos contar um pro outro, ou
para plateias pegas distraídas. No transporte publico ou nas filas de banco,
por exemplo. O streep tease da alma e o relato das acontecimentos se dá
eminentemente pela fala. "Escrever é coisa de intelectual", ouvi de
alguém. De outro ouvi "escrever pra quê, se ninguém lê".
A emergência das "redes
sociais" (um dia discutiremos esse conceito e seus impactos), contudo,
forçaram o povo a escrever. Escrever mesmo, ainda que os mecanismos de
mensagens portem ferramentas que oferecem o recurso da “mensagem de voz” para
os mais inábeis.
Escrever, porem, é via de regra no
campo restrito das redes sociais. Aí, deu-se o desastre. De uma hora a outra,
todo mundo viu-se obrigado a produzir mensagens curtas para alimentar a
comunicação diária. De outra parte, amadores premidos a forjar
"opiniões" à base da escrita e profissionais a se esmerar,
imprensados pelos dead lines
internalizados, a escrever em favor da vaporosidade da informação ou do
comentário inadiável.
Falando, mesmo com todos os cacos, cacoetes
e vícios linguísticos, a mensagem é passada. O interlocutor a capta de alguma
maneira. Escrever, porém, é um outro universo. Há milhões de regras,
naturalmente rígidas, para se produzir um mínimo texto que seja. Se vira bem
quem consegue ser intuitivo na arte ou dominar uma meia dúzia delas.
Mesmo quem escolheu viver escrevinhando
tropeça vez ou outra nas regras rígidas do escrever; trai a língua, macula-a.
Imagine, porém, quem não é muito simpático à leitura e a escrita quando se vê
intimado a produzir textos, mesmo que minúsculos, com o mínimo de
inteligibilidade. Já não se trata simplesmente falar, emitir um pensamento, uma
ideia, transmitir uma ordem. Escrever cabe no papel e expõe mais facilmente as
limitações de organização do pensamento.
Temos instalada a condição de dilema
contemporâneo. Descobre-se que a maioria de nós, malgrado nossa empáfia e
arrogância titularesca, não sabe escrever. De professores e advogados, de
desocupados zapeiros a capitães e generais. Estes últimos, inclusive, que, só
por hora, tem uma representatividade presidencial, em um bom contingente, não
foram apresentados às regras mínimas da produção textual.
Consciência do teor, domínio da técnica
e vigilância ferrenha das armadilhas da linguagem não fazem parte do repertório
de muitos contemporâneos. Infelizmente. Lê-se mal em nossos dias, é verdade.
Escreve-se porcamente. Imagine, então, os níveis de interpretação que andamos
usando por aí. O processo básico da educação cidadã pressupõe essa integração
entre esses três níveis. Se nada disso se concretiza na prática, erraram
conosco ou nos perdemos em algum ponto.
Definitivamente a página em branco ou a
pergunta “O que você está pensando” são nosso calvário. Metemos o pé e lá
estará exposta nossa ignorância; não para um ou dois leitores, mas para uma
massa. Benvindo ao campo de batalha, guerreiro! Escrever é preciso. Ter ciência
do que se escreve, e como, é imprescindível.
*Jornalista,
cronista e poeta.
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