quarta-feira, 29 de julho de 2015

Maturidade intelectual II

            Constituímos um país relativamente jovem. Os 514 anos que contabilizamos parecem, ainda, apenas um rascunho do país que poderíamos ser. Um desenho de criança não seria tão tosco. A agravante é que nos rabiscos da criança de fraldas ainda há certa graça. Nos nossos passos civilizatórios há desorganização e uma tendência grave a quadros irreversíveis de anencefalia de alto a baixo.  
            Não sou capaz de pesar até que ponto evoluímos como povo e como sociedade, mas sinto de perto o quanto deixamos de avançar e, também, o quanto parecemos regredir.
Uma historia séria do Brasil poderia nos revelar o tanto quanto andamos queimando etapas, relegando passos importantes e negligenciando experiências bem sucedidas que poderiam ter continuidade. Em nossas crises de autocritica, creditamos todos os nossos desarranjos a nossa pouca idade, como se apenas isso fosse o responsável maior pela nossa mentalidade, digamos, limitada e propensa à mesquinhez.      
            Somos um país onde, ainda, cultua-se um papel pendurado na parede e uma arrasadora festa de formatura muito mais que uma formação de fato. Não seria, claro, uma aberração gritante, se fossem casos isolados ou comportamentos individualizados. Mas nos surpreendemos sempre com a repetição em massa dessa conduta.
Parece ser mais importante dar-se a conhecer ao high society, que ter consciência do papel social a ser desempenhado pelo profissional formado.     
Somos um país onde calouros de universidade, por farra, promovem sessões de humilhação e divertimentos homicidas. Onde estudantes de medicina, por molecagem, chamam o SAMU e roubam a chave da viatura (http://rederecord.r7.com/video/estudantes-de-medicina-roubam-chave-de-ambulancia-durante-festa-em-minas-gerais-5519f9260cf26c8c7f56092a/).
Um país, onde ao que parece, a medicina e outras formações de base servem apenas, salvo raras e bravíssimas exceções, como green card para o grand monde.   
Somos um país onde certa elite adora a Europa, vendo naquele continente a excelência da cultura e do pensamento. Mas, muitos vauchers depois, um certo ar de superioridade e egoísmo, contribui para que nada do que foi visto e aprendido por lá influencie mudanças de comportamento. Ou, no mínimo, ações públicas que redundem em melhorias para a coletividade.
O choque de cultura e o lustro geram espanto e impressão de intelligentsia apurada, mas ao que parece se limita a isso.
Se pensarmos este país como possibilidade teremos que querer, sem reservas, que cada vez mais pessoas tenham acesso real e pleno a condições de formação e trânsito cultural. Talvez só aumentando o exército de formados, promovamos realmente a depuração e a excelência das cabeças pensantes e proativas.  
Creio que uma Europa (idolatrada, salve, salve!) não se fez com poucas páginas produzidas, nem com a preguiça mental para devorá-las. Muito menos com elitização egoísta do conhecimento. Lastro cultural e maturidade intelectual devem ser construídos pelo empenho e pela sensibilidade teórico-prática de adquirir conhecimento como bem imaterial, para logo em seguida   pô-lo em contato e a serviço do chão nativo da pátria mãe. Sem maneirismos ou egotrips.

por Edson de França



 



quarta-feira, 15 de julho de 2015

Idolatrias maestralizadas

Se há um troço nauseante na cultura brasileira chama-se idolatria maestralizada pela mídia. Nela, laivos de oportunismo e babaquice, uma sebosa cumplicidade entre a corda e o pescoço, formam um banquete tétrico. Servido como repasto frio para mentes distraídas, convém ao apetite voraz das massas desavisadas e ignaras.
Creio que, para uma mente minimamente crítica, o acepipe figura como empadão indigesto, imoralmente adiposo, desses produzidos a revelia em rodoviárias com ingredientes de segunda e manipulação insalubre. Claro que como todo embuste é servido sob uma aparência pra lá de asséptica para dar ares de lisura, importância e com laços parentais com os imprescindíveis da vida. Numa expressão acadêmica, processo chulo de construção da legitimidade.
Nos últimos dias assistimos mais uma vez a ensaios patéticos nessa direção. Os hegemônicos, meios fabulistas de comunicação e respectivos porta-vozes, escolheram mais um iluminado, deram-lhe uma biografia positiva e ascendente e exploraram até o fim a tragédia pessoal. Tudo muito bem arquitetado.
Um investimento de horas (regiamente desperdiçadas por basbaques de todas as idades, classes e ocupações em frente às telinhas e telonas) na construção do mito, através da exploração mais vil da sentimentalidade e da comoção coletiva. Horas de fidelidade. Investimento maciço e maquiavélico na condução das visões de mundo de uma nação (ou de uma parcela considerável dela). A frio, duas faces de um mesmo desserviço cultural.
O sentimento de nacionalidade é, entre nós, construído pela forçação de barra dos esportes. Retirando o lado positivo (que existe), o problema está na reserva com os sujos bastidores e a irrealidade que eles traduzem e a que, fatalmente, conduzem. Nos mesmos moldes, irrelevâncias do mundo pop são conduzidas ao panteão da visibilidade para servir a formatação de uma mentalidade medianamente pífia e a-estética.
Penso que há uma máxima, ao que parece cultivada pelas divinas inteligências midiáticas, que um povo precisa de ídolos e deuses. Uma coisa assim como um Olimpo. Para tais deuses, culto e submissão. Ao outros, os súditos, alimentos para a alma sequiosa por preenchimentos banais.

Para os últimos, as facilidades de apreensão, a inoculação a fórceps de visões distorcidas de mundo e de vivencias que ampliem o crescimento coletivo e a própria ascensão individual.   

Por Edson de França