Cá
entre nós, basicamente existem dois tipos de malandros. Os safos,
profissionais, e os amadores. Seguindo as lições da velha canção de Neguinho da
Beija Flor, pedra bruta no repertório do malandríssimo Bezerra da Silva,
aprendemos ludicamente que “malandro é malandro, mané é mané”. Malandros e
manés figuram no mesmo cenário, dividem a mesma cena (geralmente periférica),
compartilham os mesmos trejeitos, mas se diferenciam pelos comportamentos
endêmicos. Malandro nasce malandro. Mané é o malandro que pegou o bonde errado.
Definir
o malandro, talvez seja uma das coisas mais difíceis para os especialistas em
malocagens. Isso porque o malandro tem um perfil social (pré) conceituado pela
sociedade. A imagem do malandro pressupõe a bebida, a boemia, a jogatina, a
promiscuidade sexual e a violência latente, só para ficar na nata. Ou seja, o
ébrio, o rufião, o trapaceiro, o descuidista, o cafetão, o golpista, o mãos
leves do carteado e outros tipos são os malandros enraizados no imaginário
popular.
Tal
definição, no entanto, cai por terra quando personalidades como Moreira da
Silva, o Kid Morengueira, ou o próprio Bezerra, já citado, se definiam por outro
tipo de malandragem. A malandragem dos que bebem socialmente ou são abstêmios, não
gostam de armas nem de armações, aqueles que, ao que parece, se especializam tão
somente na difícil arte da sobrevivência. A arte refinada pelo drible de corpo
para situações limite, o olho vivo, a língua controlada, o apuro das idéias básicas,
um golpezinho de vez em quando, um blefe ou outro para manter a pele intacta.
Com
a ascensão de tal persona, aquele malandro arruaceiro e aproveitador, tende a
virar um mané de marca maior. O mané tende a projetar uma figura si mesmo, a
exaltar essa imagem, a sofrer crises agudas de destempero verbal. Podemos
dizer, sadicamente, que o mané o malandro que acreditou na estereotipia
corrente da figura. Vestiu a camisa, armou os ânimos, pintou-se com as cores e
caiu na rua acreditando-se malandrão de fato.
Quando
penso no universo e na cultura da malandrice, tendo a estendê-lo, qual
bandeira, nos varais de toda a vida. A vida em si carece daquilo que chamo de
“boa malandragem”. A malandragem vista por esse ângulo é aquela em que os
artífices são pra lá de maneirosos. Tendem a falar muito, mas não tocam em ponto
nevrálgicos que possam ferir coletivas suscetibilidades, a não ser pelo viés da
crítica jocosa, do folclórico das gentes e tipos.
Malandro que é malandro
não usa a tintura para a guerra contra exércitos bem armados ou para multidões
insanas. Sabem do seu papel limitado, camuflam-se camaleônicos, não comem a
carne onde ganham o pão, não dão a falar de si, não criam tipos que não possam
se sustentar na hora das brigas foice.
O mané, ao contrário,
acreditando que a imagem é o que vale, age com trejeitos desajeitados, cria em
torno de si lendas e hábitos, que acredita promoverem a infalibilidade e a
indestrutibilidade. Mas ficam por aí, na lenda. O mané social, na real, quer
ser o que não é. Quer ter o que não pode. Quer viver o que não lhe é permitido.
“São caboclos querendo ser ingleses” (Viva Cazuza e sua “Burguesia) ou “chupim
querendo ser cardeal”, como nos ensinava um velho excerto embutido em velha
cartilha de infância.
por Edson de França
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