quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Malandro é malandro...

            Cá entre nós, basicamente existem dois tipos de malandros. Os safos, profissionais, e os amadores. Seguindo as lições da velha canção de Neguinho da Beija Flor, pedra bruta no repertório do malandríssimo Bezerra da Silva, aprendemos ludicamente que “malandro é malandro, mané é mané”. Malandros e manés figuram no mesmo cenário, dividem a mesma cena (geralmente periférica), compartilham os mesmos trejeitos, mas se diferenciam pelos comportamentos endêmicos. Malandro nasce malandro. Mané é o malandro que pegou o bonde errado.
            Definir o malandro, talvez seja uma das coisas mais difíceis para os especialistas em malocagens. Isso porque o malandro tem um perfil social (pré) conceituado pela sociedade. A imagem do malandro pressupõe a bebida, a boemia, a jogatina, a promiscuidade sexual e a violência latente, só para ficar na nata. Ou seja, o ébrio, o rufião, o trapaceiro, o descuidista, o cafetão, o golpista, o mãos leves do carteado e outros tipos são os malandros enraizados no imaginário popular.
            Tal definição, no entanto, cai por terra quando personalidades como Moreira da Silva, o Kid Morengueira, ou o próprio Bezerra, já citado, se definiam por outro tipo de malandragem. A malandragem dos que bebem socialmente ou são abstêmios, não gostam de armas nem de armações, aqueles que, ao que parece, se especializam tão somente na difícil arte da sobrevivência. A arte refinada pelo drible de corpo para situações limite, o olho vivo, a língua controlada, o apuro das idéias básicas, um golpezinho de vez em quando, um blefe ou outro para manter a pele intacta.
            Com a ascensão de tal persona, aquele malandro arruaceiro e aproveitador, tende a virar um mané de marca maior. O mané tende a projetar uma figura si mesmo, a exaltar essa imagem, a sofrer crises agudas de destempero verbal. Podemos dizer, sadicamente, que o mané o malandro que acreditou na estereotipia corrente da figura. Vestiu a camisa, armou os ânimos, pintou-se com as cores e caiu na rua acreditando-se malandrão de fato.
            Quando penso no universo e na cultura da malandrice, tendo a estendê-lo, qual bandeira, nos varais de toda a vida. A vida em si carece daquilo que chamo de “boa malandragem”. A malandragem vista por esse ângulo é aquela em que os artífices são pra lá de maneirosos. Tendem a falar muito, mas não tocam em ponto nevrálgicos que possam ferir coletivas suscetibilidades, a não ser pelo viés da crítica jocosa, do folclórico das gentes e tipos.
Malandro que é malandro não usa a tintura para a guerra contra exércitos bem armados ou para multidões insanas. Sabem do seu papel limitado, camuflam-se camaleônicos, não comem a carne onde ganham o pão, não dão a falar de si, não criam tipos que não possam se sustentar na hora das brigas foice.
O mané, ao contrário, acreditando que a imagem é o que vale, age com trejeitos desajeitados, cria em torno de si lendas e hábitos, que acredita promoverem a infalibilidade e a indestrutibilidade. Mas ficam por aí, na lenda. O mané social, na real, quer ser o que não é. Quer ter o que não pode. Quer viver o que não lhe é permitido. “São caboclos querendo ser ingleses” (Viva Cazuza e sua “Burguesia) ou “chupim querendo ser cardeal”, como nos ensinava um velho excerto embutido em velha cartilha de infância.

por Edson de França


   
           
           
             
           

             

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