Jornalistas
são tidos, havidos e propalados como pessoas inteligentes, sagazes, intrépidas
e dotadas de um considerável transito social. Perfil nada desprezível para
mortais que, enquanto viventes, tem que reunir qualidades e ambições que
justifiquem uma passagem bem sucedida pelas vielas da terra. Faz parte da
mística profissional dos comunicadores em geral. Uso aqui o termo “mística” no
sentido da aura que acompanha certos afazeres em sua projeção social. Algo da
arena do inefável, imagem mental que anseia por materialidade.
Dizem
dos jornalistas, especificamente, que são capazes de construir ou contribuem
para construção ou formatação do mundo com palavras, por meio das informações
privilegiadas de que dispõem e manipulam. São eles seres poderosos com
capacidade de dar mobilidade e penetração social aos fatos, às situações.
Seriam assim, na linguagem vulgar, uma espécie de boateiros mais bem sucedidos
que D. Joaninha Grauçá, secretária leva e traz dos sucessos rotineiros da
comunidade do Ninho das Peruas. Claro que com maior visibilidade e legitimidade
social.
Fala-se
do honroso quarto poder da imprensa, como se isso afetasse diretamente os
agentes menores. Aqui, acho usei a palavra certa: os jornalistas são tão
agentes quanto os piões que constroem arranha-céus e jamais podem habitar suas
dependências depois de erguidas. Esqueçamos por um instante a mística que
envolve a figura e o que fazer dos jornalistas e caiamos na real. Jornalista,
salvo raras e extintas exceções, são meros instrumentos nas mãos de corporações
de toda ordem que, mesquinhamente, lhes ajudam a por feijão na mesa e ovo na
frigideira.
Inteligentes, sagazes, dotados de transito social e
manipuladores da opinião pública são atributos, creio eu, de um outra classe;
essa sim que adora ter jornalistas por perto quando holofotes e objetivas miram
seus umbigos e microfones se abrem para suas declarações bombinhas e retóricas.
O contrário, claro, também bem que pode acontecer. Quando os poderes invisíveis
não desejam sair da confortabilidade de suas camarinhas, jornalistas são
convidados a se afastarem da sala de recepções, com seus gravadores, seus faros,
suas objetivas, bloquinhos e inquirições impertinentes. O raio que os parta os
espera.
Jornalistas são as muscas
domesticas na sopa no poderoso jogo do mundão e dos mundinhos. Jamais
chegam a estragar o prato com suas perninhas cabeludas e suas probóscides sequiosas, se é isso que
orienta a crença popular. Podem contaminar o prato, mas isso é coisa besta. Ela
perturba enquanto voeja e zumbe sobre superfície das delicias e se afoga vitima
de sua própria voracidade. Nada que não se resolva. Depois de embriagadas são
atiradas ao chão numa colherada para se debater no solo até virar um repugnante
despojo.
Os jornalistas bóiam na superfície dos fatos. Transportam
versões de um lado para outro, editam, publicam em suas amadas páginas e com
isso iludem-se da posse privilegiada. Ouvem da boca de figurões e figuretas
versões bem simplificadas da realidade, as transportam nas patas e as
disseminam, muitas vezes contaminando o ambiente social. Jamais, nem ontem nem
adelante, são convidados, tem faro ou oportunidade de ir além da epiderme, de
saber como se estruturam as notícias desde o nascedouro. De olhar atrás da
camada lustrosa com que se apresentam. De aquilatar-lhes regularidades e de
expor suas entranhas. A própria estrutura dos ambientes de trabalho os limita,
os domestica, os “ingenualiza”.
por Edson de França
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