Sempre apreciei a ideia do palhaço de mola que agredido devolve a “gentileza” com um safanão involuntário, dado o movimento pendular de sua cabeçorra, na criança cruel. Adianto, jamais tive pena da criança agressora; seu
comportamento sempre me pareceu inadequado e, por outro lado, passível de ser
repetir-se pela vida a dentro.
Não
lembro bem do tipo de publicação e em que época captei a ilustração, só a assimilei
de cara a mensagem. Ela me ensinou a não distribuir violência gratuita seja
contra quem for, por mais diferente que seja da imagem que faço de mim mesmo.
Agredir o que lhe parece diferente, estranho ou frágil é o modus operandi dos
intolerantes e, infelizmente, para isso temos escola. E eficiente, diga-se de
passagem. Começando pelas mães que incentivam os comportamentos vis.
Os pais
ensinam, no aconchego de seus lares, a ignorar, zombar, agredir se possível, o
diferente. O discurso que reveste essa atitude é a defesa e a proteção de um
território. Ela é gestada no mundinho dos lares, mas se enraíza e prospera
socialmente em preconceitos de cor, condição financeira, raça, classe,
ideologias e demais modos de aparentar, trajar, agir e pensar ou provenha de
uma terra outra.
A
escola, por mais democrática e inclusiva que seja, reproduz certas cartilhas de
intolerância. Lembro-me de certo professor, não recordo bem se de Educação
Moral e Cívica (EMC) ou Organização Social e Politica Brasileira (OSPB), que
sempre que podia utilizava um chiste ou chacota para demonstrar seu desprezo
por alunos “de cor” como eu. Creio que era uma estratégia de nos expor diante
da turma, nos fragilizar e, por extensão, ensinar para a turma mista que alguns
não deveriam nem estar ali.
Anos
depois aprendi como uma brincadeira infantil, aparentemente inóqua e
engraçadinha, pode servir como inoculadora das sementes da intolerância. Foi
num daqueles programas infantis que preenchiam as manhãs dos anos 80 e 90 das
principais TVs do país. A brincadeira era simplesmente caçar “marcianinhos”.
Num cenário tosco, simulando
uma espécie de cupinheiro do serrado, estavam dispostas tocas onde se escondiam
alguns “bichinhos bizarros” que as crianças eram instigadas pela “tia
apresentadora” a capturar com redes caça-borboletas. Claro que ganhava pontos
quem conseguisse capturar mais marcianos.
A brincadeira ensina do colonialismo, do imperialismo, da
“necessidade” humana da conquista por meio da subjugação do diferente. “É
preciso conquistar, dominar, escravizar, exterminar, se preciso. Para isso
fomos instruídos lá nos nossos primórdios”, parece dizer. E não há nada ali de
subliminar, é ensino direto e reto. Por trás, contudo, ela embute um olhar que
tem que ser desenvolvido contra o diferente, o que me parece estranho.
Ao
que me consta nunca foi visto um marciano. Tudo que temos em mãos como imagens são
as suposições que invadem os filmes de Ficção Científica. No entanto, na citada
brincadeira, os marcianos eram moluscos e anencéfalos e, por essa condição,
mereceriam ser capturados. A didática da intolerância passa por esses
expedientes.
Uma
serie extensa de ensino e reforços que aos poucos vão forjando personalidades
intolerantes. Se formos contar os processos contrários, de lições para
aceitação e alteridade, creio que vamos encontrar alguns poucos. Porém os
intolerantes de plantão dirão que estamos errados e prezamos pela intolerância.
por
Edson de França
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