O
contrário, porém, bem que pode acontecer. Ou seja, naqueles casos em que a
rigor não houve estreia, e a cada novo espetáculo, reza-se para que os deuses
brincalhões e sádicos da divina tragicomédia humana permitam ao espetáculo ir
até ao final sob a incidência de percalços mínimos. Naqueles em que até o
acordar diário exige empenho hercúleo, e botar a cara na rua seja um desafio
permanente.
Eis dois
cenários contraditórios da vida, resumidos em dois patéticos parágrafos. A via por
onde caminhamos nem sempre é pavimentada, a iluminação é ruim em muitos pontos
e até a própria condição nata dos sentidos dos caminhantes são determinantes na
condução do percurso. Além de tudo, ainda pairam, em torno do caminhante,
energias colaterais, por vezes regiamente maquinadas, que atrapalham em muito o
caminhar.
A
existência não tem manual de instruções. Mover-se em meio a ela, prover o
mínimo necessário para sobrevivência em meio ao tiroteio não é tarefa fácil.
Quando falamos em mínimo, não estamos falando só de pão, esses da esfera
material. Há elementos de ordem psicossociais que determinam, a rigor,
comportamentos caros à vida como os estados motivacionais, os trânsitos
sociais, as escaladas ascensionais de status.
Encarar
a vida, ter a “boa malandragem” de adaptação às condições inóspitas, o toque
safo pra fugir das armadilhas e outras artimanhas para mandar tudo às favas vez
por outra são, digamos, ingredientes básicos no composto do homem.
Viver
é contabilizar sucessos para alguns. E conta-los, posteriormente, batendo
orgulhosamente no peito, como a dizer que a vida é fácil, para plateias
embasbacadas. Para a grande maioria, viver é ter que encarar desafios. A
expressão “enfrentar um leão por dia” caberia bem ao desafio de quem tem que
encarar a vida sem muitos recursos ou providenciais ajudas da estrutura
familiar e social. Viver é processo de perguntas e respostas. Perguntas
rascantes que exigem respostas rápidas e, se possível, engenhosas, límpidas e
honestas.
Numa
dessas publicações que circulam na Internet e vira, por insistência, citações
recorrentes no Facebook, Eder Medeiros enumera uma série de ações para encarar
a vida. Para ele, viver é “tentar, arriscar, errar, sorrir, chorar, contemplar,
se aperfeiçoar, se dedicar, permitir, sonhar, voar, planejar, fazer, perdoar,
se envolver, amar”.
Cá
por nós, só pra concluir, vamos de Paulinho da Viola, que sabiamente ensinava que
“é preciso viver e viver não é brincadeira não”. O barco é precioso, frágil e
as marés temperamentais; o timoneiro, este ente inteligente e falível, tem que
dosar coragem, ousadia, ritmos e prudência para ir, passo a passo, encarando a
vida, ciente das dimensões do barco e dos humores inesperados das marés.
por Edson de França
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