terça-feira, 12 de abril de 2016

Diletantismo improdutivo

     
      Inquiri um novo amigo do peito e da mente para saber minimamente o que quer dizer a palavra diletante. Queria conhecer a palavra. Primeiramente por seus atributos semânticos formais e, num segundo plano, pelos qualificativos atribuídos a quem se autodenomina, é alvejado ou padece dos sintomas advindos de tal denominação.
Diligente, meu amigo Google (isso daria uma bela canção de Raul!), me apontou alguns qualificativos. Uns muito bons. Inclusive me considerei diletante pelos seus aspectos mais positivos, claro. Analisemos o que me soprou o parceiro.
1.   (Obsoleto) aficionado por música;
2.   (Extensão de sentido) amante das artes e literatura;
3.   quem se ocupa de um assunto por gosto, como amador, e não como especialista;
4.   quem muda com muita frequência o objeto das suas atenções (o que, muitas vezes, está associado à ociosidade); quem não mantém o foco em um assunto ao qual atribui prioridade (ou em poucos deles) e o(s) abandona antes de alcançar objetivos palpáveis.
Dessas quatro acepções, em pelo menos três me encaixaria. Assumiria, ou melhor assumo com orgulho os qualificativos descritos. Explico. Curto música sem limites, amo todas as formas de arte e cometo minhas literatices (eita, palavrinha pejorativa!) e me ocupo, como artífice, de alguns fazeres (gastronomia, poesia, música, serralharia e artes plásticas).
Como minha sobrevivência não me exige dedicação integral a nenhuma delas, posso me permitir brincar com essas expressões, distribuindo meus mimos e atenção a elas na hora em que bem quiser. Nada me é exigido nesse tocante, nem por quem está fora, me vê e me analisa, nem em minha consciência vaga. Deixei-me ficar por aí.
Contudo, pensando em algumas situações que envolvem pessoas e atos reprováveis, do ponto de vista profissional, apliquei à escandalosos comportamentos alheios a condição de diletantes. Ao abuso do exercício do dilentatismo como descompromisso e desleixo. Utilizei-a como sinônimo de entes desistentes e indecisos, porém mantive a dúvida quanto à precisão daquele vocábulo para o caso.
Mas este foi o motivo inicial da oitiva ao “pai dos burros” digital. Fiquei contente, após a saciar a curiosidade com o achado, de minha sagacidade verbal e resolvi digerir um pouco o conceito.
Pus a carapuça. Encontrei-me, nu, em algumas situações de desistência e indolência. Mas como toda auto-estima que se preza, acabei por me perdoar, deixando para o futuro uma análise mais impessoal de minhas diletâncias não doentias, sobretudo aquelas que, pela amplitude de alcance, acabaram por prejudicar pessoas ou os grupos profissionais em que me insiro.
O diletantismo, na sua pior acepção, é um vicio moderno, detectável com relativa facilidade nos meios profissionais. Em meio a idéia de competitividade nos negócios e, internamente, nos microcampos de trabalho, as pessoas se sentem impelidas a portarem-se efetivas e (oni) presentes. Pior, sugerirem competências que, na grande maioria das vezes, não passam de ensaios de fancaria.
Bem pior, porém, é constatar após rápida convivência que os adeptos dessa fraude profissional não passam de entidades rasteiras em conhecimento, em habilidades e, sobretudo, em competências para exercer com afinco aquelas atividades a que se propõe entusiasmadas num primeiro momento.
Por hábito, as pessoas passam a assumir (ou presumir) aptidões para atuarem nas mais diversas áreas e embarcam nos projetos sem a devida carga de humildade e sentimento de colaboração. Após as decepções naturais advindas de seu despreparo, saltam do barco, lavando as mãos, reclamando de deus e do mundo e, sobretudo, frustrados em seus desejos malfadados de se destacar, afinal era esse o seu intento inicial.  
Entendo profissionalismo como a capacidade de dominar uma área de atuação com a leveza dos aprendizes. Ou seja, nada de orgulho e, sim, ciência do oficio e a consciência de que não sabe muito, estando sempre apto a novos aprendizados. Além disso, certa habilidade para adaptar-se a mudanças com tato e positividade. Tudo, claro, com a plena ciência de que desistências por capricho ou inadaptibilidade prejudicam a produção grupal e maculam o ser enquanto profissional. Nada que condiga com o comportamento nocivamtente parasitário dos diletantes de carteirinha.
No mais, mudar é sempre necessário, preciso, vital, mas pular de posto em posto, sem gerar contribuições e imprimir marcas é a antítese dos competidores e empreendedores. É, em suma, um processo de auto-sabotagem que, por exercício deliberado e irresponsável, espalha malefícios e contamina todo o tecido das linhas produtivas, descaracterizando seus objetivos e metas.  
por Edson de França

   

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