sexta-feira, 15 de abril de 2016

Sem choro e sem vela

No episódio fatídico da malograda Copa do Mundo de 2014, assistimos a um impressionante comportamento remissivo e bem "a nossa cara". A lesa contagem regressiva para a almejada conquista do hexacampeonato mundial. Eram sete os passos que nosso treinador fazia questão de lembrar, a todo instante. Era o prólogo de cada partida. O ensaio tatibitate do êxtase, materializado num galope cabalístico.
O ato (ou a bravata, como queiram) era uma espécie de referência honrosa à moda criada por Mario Lobo Zagalo, durante a campanha do tetra, em 1994 (Diga-se de passagem, a conquista mais insossa de que se tem noticia na história dos mundiais. Tanto que acredito que ali os deuses vagabundos do futebol, desocupados que só eles, ali puseram as mãos e jogaram os búzios).
Nosso treinador embarcou na mesma onda e passou a destilar um mantra – uma forma de patuá vocálico - para atrair bons fluidos, creio. Eram os sete passos para a conquista, mas os deuses também vingativos do futebol injetaram câimbras nas canetas da “poderosa” equipe ali por volta do quinto, quando, para não fugir do cabalismo, sofremos uma derrota acachapante por gloriosos sete a um.
A referência aberta aos dotes advinhatórios e cabalísticos do “Velho Lobo” nos remete, sem escalas, a um dos nossos maiores problemas. Deixamos de lado muitas vezes a seriedade, a análise prática das coisas objetivas, e caímos no mundo das fabulações, como se toda conquista fosse dom divino e se sustentasse a base de forças extra-humanas ou do acaso das meizinhas, dos feitiços caseiros, das crendices e das superstições.
Nossos boleiros de bancada, por sua vez, recorrem ao baú dos tabus para vender a ilusão de vitória, como se isso valesse como passaporte fiel para atingir objetivos. Daí, a forma escolhida para antecipar um resultado satisfatório é ir ao baú da história para enumerar coincidências. Tomamos com esse comportamento muito gols. Um daqueles sete ao menos pode ser creditado nessa conta aí.
Foram sete gols. Rápidos, certeiros, mortais. Foram sete gols e a Seleção brasileira amargou o malogro do sonho do hexa campeonato. Foram sete gols construídos de forma até simples. Uma engenharia eficiente como um elevador da Thissen Krupp ou da Atlas Shindler.
Perdemos para uma seleção tida e alardeada como mecânica. “Os alemães tem cintura dura. Prá cima deles, fulaninho dos anzóis”, bradava um de nossos “queridíssimos” locutores esportivos. Saibas, porém, Macunaíma, que a mecânica casa-se integralmente com a tecnologia e esta, diretamente, com os conceitos qualificativos de eficiência e eficácia.
As peças dos Mercedes Benz ou dos Audis da vida, ao que me consta, não são feitos de geléia e, mesmo assim, quando postas em movimento, agem como equipe. A deficiência motriz de uma peça é sempre compensada ou complementada por outra. Ao final, a máquina mostra sua forma ágil, dinâmica, efetiva, vitoriosa. A máquina que queríamos ter, seja como protótipo de nossa eficiência, seja como seleção, né não?

Se o futebol ou aquele episódio em especial serve-nos de lição, que se fixe apenas uma. Somos uma gente dada fé e, através dela, tentamos superar nossa falta de empenho nos estudos, na pesquisa, no planejamento, na construção do conhecimento, na confecção das estratégias e na antecipação dos fatos. Fazemos muito esforço, é inegável. Mas largamos tudo, num piscar de olhos, ao sabor das improbabilidades dos acasos felizes. Somos assim no futebol, na politica e em vários outros quadrantes da vida mundana. Infelizmente.

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