O que me difere da maioria dos professores é ter uma carreira voltada
para o ensino superior profissional e, como jornalista teimoso e analista
bisssexto, vez por outra poder refletir sobre problemáticas ligadas ao
cotidiano desse oficio. No espaço efêmero da web, tenho possibilidade de divulgar
as poucas idéias que assomam às regiões ainda ágeis do cérebro. Coisa que para
outros companheiros reduz-se ao âmbito da ruminação solitária, ao circuito informal
das lamentações entre os pares mais próximos ou mais" modernosamente" pelo compartilhamento
de frases feitas no Facebook.
Falo da política nacional, da estrutura sofrível das escolas, do liseu
endêmico da classe, do desrespeito patronal, da afronta do alunado dessa
geração, da tirania dos que, não dando aulas nem sabendo o que é educação,
posam de empresários do setor (visam apenas lucro à custa da atividade) ou
burocratas nas instituições públicas (à sombra, escondendo-se, vegetam entre
avaliações parciais e perseguições mesquinhas). Enfim, contradições, percalços frustrações
e sucessos (mínimos, ressalte-se) que acometem o pobre ente que se dedica a
esse mister .
Não creio que ensinar em tempo algum fosse uma tarefa fácil. Ensinar,
antes de tudo, é expor-se. Exposição, em termos humanos, é sinônimo de
fragilizar-se. Ou melhor, é diretamente proporcional. O inverso seria
ocultar-se, proteger-se, esconder-se para tornar-se inatingível. O homem é bem
mais forte na condição dos eremitas ativos, possuidor de couraça que lhe
faculta certezas e segurança. Tendentes naturais ao parasitismo, tais seres
engordam a partir da letalidade de seus ferrões. Essa é a estratégia dos vilões
que, destilam seus ativos venenos, enquanto prosperam nas sombras.
Ensinar pressupõe lançar-se ao mundo com pouquíssimas armas, adoração
pelo improviso e algumas crenças. Depois, só consciência disso tudo é,
sobretudo, que as crenças são totalmente falíveis.
Por armas entenda-se conhecimento. Algo que você aprendeu por processos
variados, sob determinadas condições, controles e uso desabusado de algumas
competências. Depois, sob a crença de promover mudanças fundamentais na
sociedade humana ou simplesmente para sobreviver dos réis que o trabalho
permite, você vai ao campo de batalha. O cenário de luta não é outro senão a
jurássica sala de aula.
Sala de aula é o “campo da batalha” do bem. A não ser que um ser mal
intencionado (e eles existem) adentre aquele ambiente, a noção ali é do bem
comum. Vivência, convivência (um ano para o ensino fundamental e médio, seis
meses para os cursos superiores), o compartilhamento de conhecimentos e,
idealmente, a formatação de novos saberes.
“Campo de batalha” porque o ser humano não é fácil. Sala de aula é
processo de comunicação em estado nevrálgico. Nervos expostos são egos, idiossincrasias,
orgulhos, avaliações apressadas, criticas comezinhas, desatenções naturais ou
orquestradas, incompreensões de qualquer das partes, medo ou negação da
interação.
O professor não tem que ser um artista de alma aberta e gosto pela
liberdade de pensamentos. A sociedade não o concebe nem o aceita assim.
Cobra-lhe inclinação, maestria, capacidade, disposição, talento, competências,
habilidades, denodo, eticidade, aptidões, desvelo, domínio de conteúdos
compatíveis, posicionamentos conservadores. Ufa!!!!!! A ferro e fogo, o
professor tornar-se-á arauto da tradição, dos poderes e da autoridade. Alguns,
então, por tão envoltos nessa vã consciência, viram mais autoridades que
qualquer coisa.
Mas, contrariando expectativas e dadas as condições objetivas de trabalho,
o professor veste a pele de astro do improviso. É o artista do “circo sem
lona”, o alvo, o bufão, o Corcoran para uma histérica rainha Valentine. É ele
quem busca na experiência, para além de onde os papas da pedagogia prescreveram
e as políticas públicas ditaram, a “solução caseira” para problemas bem
concretos. É ele quem atura. É ele quem, sozinho, questiona as próprias
capacidades. Duvida delas. Dia seguinte, contudo, mala nas costas, pé na
estrada, vai em direção a um novo sucesso ou esbarra na abusadissima incompreensão
programada.
Ensinar, enfim, não é missão, nem é sacerdócio, nem meio pobre de
sobrevivência. É processo. Arte configurada socialmente com o intuito de por
frente a frente pessoas, individualidades (geralmente de idades diametralmente
opostas), num pacto de troca de conhecimentos. O novo entra em contato com o
velho como numa reação química. As interpenetrações são inevitáveis. Do choque
deve, mais que tudo, surgir o novíssimo. Quando não rola a inovação, nos
rendemos ao marasmo, ao mais do mesmo.
Professores jamais serão capazes de avaliar o nível de aceitação e
aprovação de seu desempenho por parte dos alunos. Ficamos com a nossa própria
avaliação e acabamos meio que convencidos de que fizemos um bom trabalho. Mas,
no fim, temos que deixar claro que nossas escolhas (uma espécie de edição) dos
conteúdos que levamos as salas de aula podem não ser as mais perfeitas e,
também, que nosso desempenho pedagógico pode não atingir os objetivos traçados
para qualquer ação de ensino-aprendizagem.
por Edson de
França
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