Comecemos pelo vocabulário básico. Cães miúdos são diabos reles. São desses que nascem por qualquer descuido, proliferam feito praga e sobrevivem à base de qualquer oportunidade. Desprezíveis, numa palavra.
Cães miúdos nascem e vivem
como ervas. Não dessas que dão “baratos totais” ou curam tosse, não; são ervas
daninhas que se espalham graças à estúpida morte do capim. São sanguessugas,
vamps, parasitariamente mamando e matando incautos hospedeiros.
Travei contato com vários
da espécie e já fui, “pense” (detesto desse cacoete verbal), convidado e
intimado a fazer parte da legião. Pergunte-me se fui¿ Estou escrevendo aqui
para não ser parcamente lido; ao lado dos cães miúdos nem precisaria escrever.
Os cães miúdos, dentro do
seu expediente, providenciariam uma blague para me bajular, jurando uma
intimidade profunda com o apelo ventilado em meus inexistentes textos.
Insistirei sempre na
manufatura do texto, na defesa do espaço crônico que faculta ao escrevinhador
um mínimo de autonomia. Ela é a lupa que permite flagrar o cão miúdo em sua
mais expressiva pantomima. A oração que permite afastar os cães de toda ordem.
Os cães miúdos estão por
aí travestidos em jogadores de pelada, operários medianos, grumetes e
servidores temporariamente compondo a base do serviço público ou ASPONES de um
secretario qualquer. Tem por expediente ofícios caídos no anedotário popular.
São os baba-ovos, cheleléus, puxa-sacos, chaleiras, bajuladores, lisonjeadores,
mantegueiros e lambe botas.
Quando os anjinhos do
tempo em que vivemos saem às ruas e pedem intervenção militar, volta da ditadura
e assombrices parecidas nada mais querem que seus lugares de cães miúdos num
possível novo sistema. Uma legião de dedos duros iria, caso a turma da pesada
assumisse o poder, se espalhar por aí.
A democracia é o inferno
dos cães miúdos porque nelas eles não se criam, dito melhor, ate procriam feito
peste, mas são abortados instantaneamente. Aos primeiros voos, não conseguem
camuflar a desfaçatez, o oportunismo e a canastrice de suas ambições.
Os cães miúdos necessitam
de ambientes que lhes facultem poderes e não se lhes questionem, mesmo nas decisões
mais estapafúrdias.
O cão miúdo quer, ao final,
foder alguém em nome de seu status. O cão miúdo que aqui evoco está bem retratado
no filme Ojuara – O homem que desafiou o diabo (Brasil, 2017). Uma ser
que pode até ter uma personalidade e uma aparência sociável mas, ao fundo, são
compostos de pedaços desconexos que jamais se juntarão numa fôrma harmônica,
num comportamento social digno e mentalidade aceitável.
Por Edson de França
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