quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

Os donos do mundo

 


A
credito que os membros mais “descolados” de minha geração - aqueles que curtiram, mesmo por osmose, a literatura de Erich von Däniken, Hernan Hesse, Revista Planeta, discos voadores aos tragos de um “back bem bolado”, esses últimos nem que fosse olfativamente -, desde logo se acostumaram a pensar em mistérios e “teorias da conspiração”. 

Talvez por vivermos a sombra pestilenta da ditadura, da qual pouco sabia-se da profundeza dos porões, essas ideias encontrassem um campo fertil para se expandir. Talvez como alienação, talvez como “mecanismo de fuga” frente às tímidas desconfianças de que o governo de então não era a superfície garbosa e ufanista demonstrada nos desfiles cívicos de 7 de Setembro. 

A impressão geral é que, para além dos diretores de escola, rezadores de ave-maria, imberbes e empolgados samangos de pré, haviam sempre “hipócritas” de todos os tamanhos “rondando ao redor”. Muito além deles, os “donos do mundo”, encarnadas em sociedades secretas, os organismos multinacionais conspiratórios, as frentes interplanetárias de dominação terrena, a conspiração dos organismos biológicos invasores de corpos e usurpadores da vontade alheia. 

A idade dos “assustados” foi também a era da desconfiança. Penso que, diferente de gerações anteriores, naquela época as ficções científicas, marcadas pelo traço da distopia, se materializaram em imagens de cinema. A ideia e, em muitos casos, a materialização do poder em atos tomados à revelia da opinião pública através do poder de Estado e de corporações foi marcante. 

A frustração com a promessa de “desenvolvimento e progresso” das cidades, indivíduos e populações inteiras também alimentou essa “impressão”. Efetivamente, quanto mais inferiorizado na pirâmide social, mais impactado e totalmente alienado desses processos de poder. Usei a palavra “descolado” no início do texto para indicar uma classe específica de gente: uma que, se não é capaz de fazer uma análise cientificamente elaborada da dinâmica social, sente as antenas tremerem toda vez que a terra geme.   

Particularmente, a ideia de que o mundo teria “donos” manipuladores, sempre dispostos a manietar os cordéis de nós, os marionetes, assim como organismos parasitas de toda ordem prontos a se alimentar da seiva quente direto da jugular sobreviveu. Sobreviveu e, ao longo da jornada, passou a ser identificável, seja pelo abuso do poder psico-atordoante das religiões, por exemplo, ou pelo flagrante desrespeito diário das corporações aos direitos humanos.

 A materialidade dessas impressões esotéricas se fez sentir principalmente pela observação da Mídia, numa leitura livre do conhecimento produzido pelas Ciências da Comunicação. Parece sempre que a mídia concentrava todo o poder dos “donos do mundo”, sendo uma espécie de porta-voz, assessora e, sobretudo, artífice do discurso dos poderosos invisíveis. 

Nesse contexto, as atuais redes sociais, cujos CEO’s não escondem a cara, nem se furtam de apregoar suas “ideologias” para audiência mundial, a ideia de que o mundo tem donos, ou aspirantes sedentos ao posto, se consolida. Os “donos do mundo”, malgrado anunciarem a modernização com suas inovações tecnológicas, sempre que podem atuam para limitar as “transformações sociais” ou retroagir até o status que conceda “segurança” perene a seus empreendimentos. 

Assim, a atração deles por governos de viés autoritário é natural e recorrente. Como qualquer matéria parasitária que se preze, os “ambientes úmidos, de pouca luz e com matéria orgânica em decomposição” são ideais para sua proliferação. Se esse ambiente permite, então, dominar mentes pelo exercício farto da omissão de fatos e controle pela força ou pela sugestão psicológica, então…

Controle social” significa ganho, sendo assim um recurso largamente utilizável. Os “donos do mundo” têm ciência plena disso. A desinformação, a pavimentação de estradas para o exercício da mentira, das versões parciais ou equivocadas e outras artimanhas fazem parte do pacote. Cabe aos “descolados”, os desconfiados militantes de sempre, como antenas da raça, manterem-se captando cada onda reaça que ameace, ao menos no nível comportamental, o Homem. 


por Edson de França   

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