quinta-feira, 9 de abril de 2020

VINHO

É cor.
Não única, uma paleta
Do branco ao vermelho
Quase negro.

É prazer.
Do travoso, tanino
Ao vadio açucarado
Porre, dor…

É encontro
Copos, taças
Descartáveis corpos
Brinde a ti.

(Edson de França)

QUANTO MAIS VELHO…

Sou antes um mutante envelhecido
Dos tempos em que poeta, já tontinho
Explorava e abusava das metáforas
Sobre as relações da flor com o espinho
O que resta, porém, já ultrapassado, é
Crer na lorota do espírito do vinho.
(Edson de França 05/04/2020)

Dupla face da coroa

A coroa é símbolo ancestral
Expressão do fausto, da nobreza,
Do sangue azul, da descendência nobre
Ao olhar do ingênuo: divinal beleza.
Entanto, objeto de raro simbolismo
Tantas vezes esconde só a vileza.

Aparentemente contraditórias
Duas versões deixam faces nuas
Que equiparam o ser humano ao verme
Onde lê-se poder, leia maldades cruas
Vozes e atos que endeusam a ignorância
E ameaças mortais que esvaziam ruas.

Silêncio de vírus é ameaça concreta
Furtiva, invisível, ladina e real
É coroa por feição, formato, estrutura
Com que se apresenta afinal
Em humano é adereço ou idéia
Que sobe a cabeça e inspira o mal.


(Edson de França, 06/04/2020)

Deus
Impávido
Nem aí
Olha pela brecha.

Abstém-se da votação.

Vocês se criaram
Culpem-se.

Porção


Despertai.
Não são os deuses
que tem que olhar-se no espelho.

Deuses
São o que serão
E jamais mudarão de face.

Tu, humanamente 
estás, viverás, prosperarás,
morreras ao fim...

És deus
Reconhece-te a ti.

quinta-feira, 12 de março de 2020

O destino do Almagre



                


As ruínas do Almagre surgiram em meio ao campo recém-capinado. Afora uma árvore frondosa no centro do terreno, toda a vegetação em volta parecia ter passado por um processo de queima. Arbustos, galhos caídos e grama rala exibiam a coloração, entre preto e o amarronzado, que denuncia a passagem lasciva das línguas de fogo.

Estacas pré-moldadas formavam um simulacro de cercado, do qual os fios pareciam ter sido roubados. Antes das ruínas propriamente ditas, outra parede de folhas de zinco dizia, por sua vez, “aqui há uma obra em andamento”.
            Mas nada havia ali que sugerisse uma obra de (re) construção ou de produção do conhecimento para recuperação do bem histórico. Nada de operários, nada de pesquisadores. Nenhum visitante.
O centenário convento, um dos pilares da historia da Paraíba, jazia ali, semimorto, como um ancião mal das pernas sustentando por próteses emergenciais. Todo conjunto posava sustentado por escoras de madeira para as lentes que ousassem flagrar, ao que parecia, os estertores de uma massa em processo apresado de falência.
Pedras espalhadas ao redor formavam montículos que pareciam escorrer da construção principal. Ela, em verdade, parece derreter-se a olhos vistos. Um monumento aclamado que vai, aos poucos, dando adeus. Abandono e resignação.
A história nos conta que a Igreja de Nossa Senhora de Nazaré, também conhecida como Igreja do Almagre ou Ruínas do Almagre, esta localizada na praia de Ponta de Campina, no município de Cabedelo, litoral norte do Estado. A igreja foi erguida no início do século XVI (1598), no contexto do processo de conquista do território e de catequização dos indígenas na Paraíba.
Não há referências à presença do templo na localidade em épocas anteriores. Ele aparece nos registros, em 1804, como parte da propriedade da Praia do Poço e é descrita como uma “igreja de pedra e cal coberta de telhas”. As ruinas encontram-se tombadas desde 1938 pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Hoje, elas se encontram em áreas particulares, havendo um acesso provisório ao local.
Eis o destino dos monumentos históricos a céu aberto, dos museus, da memória, enfim, da cultura brasileira em si. No brasil sobram recursos para a arrogância e a prepotência; faltam, porém, para a sensatez e a temperança. Esbanja-se no financiamento da desimportância que elogia a burrice. Relega-se à condição de mendicância a inteligência, o conhecimento, a preservação da memória.  
No caso do Almagres, como no caso de muitos outros monumentos, há situações burocráticas e pendencias junto à justiça que impedem uma ação efetiva de recuperação da área. Mas até mesmo os projetos que parecem dar um alento não ganham a continuidade merecida.
Em 2016, prefeitura e IPHAN anunciaram uma parceria em que a área seria limpa, sinalizada, cercada, teria as vias de acesso pavimentadas e toda área iluminada, além se serem definidas a inclusão do monumento no roteiro turístico da cidade, bem como os critérios de visitação. Também estavam em pauta estabilização das ruinas e a recomposição do monumento através da recolocação dos elementos em suas posições originais.
Aos olhos da época soou auspicioso, o plano. A preço de hoje, o item conservação – mesmo emergencial, como se falou a época - passou longe.
por Edson de França (Jornalista, poeta e cronista)      




quinta-feira, 10 de outubro de 2019

Nas entrelinhas da notícia




por Edson de França*
A notícia

dava conta que um grupo de moradoras de endereço nobre da capital, o charmoso Cabo Branco, teriam procurado a vereadora Helena Holanda, pessoa ligada às causas das pessoas com deficiência, para "recomendar" o deslocamento de um projeto de inclusão, desenvolvido no local. A justificativa apresentada por elas é que a presença daquele publico no local, aos sábados, além de enfear, tiraria o sossego dos "ilustres" moradores.

Soou

surreal. Tanto que algumas pessoas chegaram a duvidar da veracidade da informação, creditando-o a um possível marketing eleitoreiro por parte da denunciante. Sou dos que apostam na veracidade do fato. Não duvido da ardilosidade de nossas "elites" em compor enredos, a sorrelfa, dignos de uma roteiro de bizarrices e abjetividades para Pasolini filmar. Pergunte-me ao final que são realmente os deficientes. Os que buscam por dignidade ou aqueles que abusam da prepotência, teoricamente tendo tudo nas mãos, inclusive, o direito de serem agressivos e desrespeitosos com a condição humana?

Concordei

com todas as análises feitas por profissionais e internautas sobre o comportamento das corocas do Cabo Branco ao propor o fim de uma ação social em prol da inclusão da pessoa com deficiência. Quem ergueu a voz ou empunhou a pena tocou na ferida. Verifica-se nas entrelinhas do ato a escândalos idade de uma mentalidade preconceituosa, higienista, excludente e arcaica. Ela anda sempre se fingindo de morta. Momentos, porém, como o atual parece favorecer o seu arrogante desabrochar.


Outra

proposta indecorosa das quatrocentonas senhorinhas, de acordo com a vereadora, seria a instalação de portões para isolar a praia, ou seja, criar um ambiente de acesso restrito. Uma praia particular. Não me surpreende. Pelo desejo supremo da nossa caquética elite da capital com seu impróprio nome, o tal muro ou portão deveria ser estrategicamente colocado a altura da rua Tito Silva, nas proximidades do Clube Cabo Branco. Assim a ralé, salvo talvez a descida dos blocos onde a "massa" serve pra fazer números e bater recordes de público, só teria acesso nos dias úteis a trabalho. Muito mal pago, diga-se de passagem.

A busca

pela otimização do atendimento aos usuários dos serviços de saúde passa obrigatoriamente pela qualificação dos profissionais. Isso é fato. Porém, há outra preocupação que começa a se expandir no meio que é a atenção ao bem estar desse segmento. A consciência que se forma é que um profissional desequilibrado, física e mentalmente, atuando em um ambiente estressante não rende bem. Assim como, um local onde possam relações humanas insalubres não rende boa produção por mais qualificação ou destreza laboral que o profissional ostente.

Ações

é que não faltam nesse sentido. O "Cuidando do Cuidador" é uma das iniciativas que atendem a essa necessidade. A proposta do movimento é introduzir técnicas de autoconhecimento, aliadas a práticas integrativas, para promover a saúde integral dos profissionais da saúde. Seguindo essa inspiração, o Hospital Santa Isabel, de João Pessoa, criou o “Espaço Florescer” para realizar procedimentos terapêuticos de apoio a saúde física e mental dos servidores.

Mais uma

iniciativa partiu da Secretária de Saúde de Cabedelo, via Coordenação de Saúde Mental, que na última semana detonou um processo de multiplicação de promotores de saúde mental, uma alternativa possível para o arejamento dos ambientes de trabalho com a saúde. São propostas e ações direcionadas, preponderantemente, a saúde do trabalhador, mas sobretudo ao atendimento dispensado ao usuário final dos serviços de saúde. Investir na humanização é levar em conta todos os elos da corrente.

*Jornalista, cronista e poeta