Edson de França*
“Todos os dias é um vai e vem/ A vida se repete na estação/ Tem gente que chega pra ficar/ tem gente que vai pra nunca mais (...) E assim chegar e partir são só dois lados da mesma viagem”, cunharam os poetas Fernando Brant e Milton Nascimento na inesquecível canção Encontros e despedidas (Milton Nascimento, 1985).
Quando os poetas utilizam a palavra ficar não querem dizer efetivamente permanecer na estação. As estações são portas para quem chegou para ocupar um lugar no espaço da cidade. As estações são lugares de passagem. Não são definitivamente locais de permanência prolongada. Os transeuntes estão ali temporariamente. Objetivos, buscam apenas embarcar em um meio que os transporte a algum lugar outro.
Vão às suas casas atender compromissos profissionais, visitas sociais ou familiares. Chegam à estação, aspiram ar, analisam o ambiente, acabam respirando algo – se forem ao banheiro, então, seus narizes serão contemplados com um misto de odores do cão - e levando consigo suores, fumaças de cigarro, perfume barato, resquícios de gente em movimento em si. Demoram-se pouco. Se vão.
São populações hegemonicamente flutuantes. As estações são mutantes, multiformes, transformam e redimensionam imediatamente sua paisagem. Obedecem à logica cartesiana e inexorável dos relógios. Ali todo mundo tem pressa. Até os que chegam “só para olhar” tem um tempo determinado.
Seja de ônibus, trens, metrô, o que se quer é sair dali, buscar destinos. Deseja-se, na maioria dos casos, é abandonar o local, permanecer só o tempo da espera.
Mas como é toda regra tácita, as exceções mostram-se escandalosas. Há uma população que fica, se estabelece, cria raízes. Uma turba que trafega entre o mundo visível e o invisível. Que ficam ali, feito árvores, monumentos a estática humana tão somente por não ter onde ir. Um endereço, um CEP...
Os terminais de integração, as rodoviárias, as estações de trem vivem uma rotina intrépida. Movimento e pouca permanência dão o tom, fazem a logica e até o charme prosaico do local. Os que, por necessidade, ali criam raízes são a vida que estagna, a paisagem vegetativa, a hera, a flor vital exposta a intempéries da razão humana. A paisagem se pintada, cantada, descrita ou documentada, os contempla. Não os inclui, os fixa em cores, sons, versos. A insensibilidade humana, por seu turno, jamais os lê.
*Jornalista, poeta e cronista