Edson de França*
Imagine
um monte. O bíblico Sinai ou o mortal K2 himaláico. Ao sopé de qualquer um
deles, imagine-se. Você não passa de um minúsculo e insignificante ponto.
Frágil, ignorante, embasbacado diante da grandiosidade pétrea cabe-lhe tão
somente admirar e sonhar com o topo. De lá, quem sabe, outra visão da terra. Do
alto; serias, também quem sabe, uma outra pessoa, portarias outro status.
O topo do monte seria, por nossos critérios
materiais, introduzido no imaginário como o ideal da ascensão. Ascensão social
que está atrelada às conquistas financeiras, do conhecimento do poder e
proeminência sobre os semelhantes. O topo entre nos é visto como a meta, o
ideal, a conquista derradeira. Estar no ponto mais alto, no cume da montanha é
possuir, mas sobretudo projetar uma aura de poder. Para tanto é preciso subir o
monte.
Falei
de conquista e reuso o vocábulo. Conquistas, por vezes, nem carecem de
materialidade: a simples sugestão de que as detém permite ao possuidor imprimir
uma marca e, entre os seus, amealhar respeito.
O
mundo endeusa os conquistadores, os que estão ou parecem ter ido ao topo. Aos
vencedores, seja pessoa comum ou rara, a posse de uma bela habitação, um
endereço nobre, um automóvel da moda, um titulo nobiliárquico, um alto posto
político-administrativo ou um enfieira de títulos dos píncaros acadêmicos
impressiona bem.
O
catecismo de algumas congregações neófitas, ditas cristãs, usa Deus abertamente
para abrir portas que levam o comum das gentes a ansiar por conquistas. Fortuna
ancorada até as raízes nos tais “sinais exteriores de riqueza”. Teologia da
prosperidade.
Para
receber das mãos de Deus as Tábuas da Lei, o teimoso Moisés teve que secar as
canelas na subida, enfrentar a solidão e o desamparo suar frio e desafiar a
incredulidade, quem sabe o escarnio, de seu povo. Para conquistar o K2,
arrisca-se a vida, entregando-se ao frio inclemente, ao risco de hipotermia e à
ameaça das nevascas ameaçando a toda hora transformar o vivente em fóssil
preservado para estudo das gerações vindouras.
Quem
viveu, enfrenta ou frequenta a rotina da vida acadêmica convive diariamente com
exemplares prontos e acabados de historias e “estórias” de sucesso. No primeiro
caso, as pessoas que tem de fato méritos garantidos por seu empenho e
competência. No segundo, as que fingem ter conseguido chegar ao topo. O sucesso
acadêmico é um troféu que muitos desejam, sobretudo para ostentar.
Muitos desejam a glória acadêmica, seja conseguida
por estudo ou osmose. Curiosamente a horda que ora ocupa a cena politica já foi
flagrada, em vários momentos, utilizando-se de ardis para mostrar sua carga
acadêmica. Valem a procedência da diplomação, a proclamação pública de títulos
conseguidos deus sabe-se como, a inclusão de titulações no currículo e, por
fim, quando há um traço de verdade, o trabalho mostra sinais de desonestidade
intelectual.
O
tempo atual pôs em cena a “teologia da sublimação”. Talvez em época alguma ela
tenha conseguido tanta visibilidade e amealhado tantos adeptos. Trocaram o ser
pelo ter. Não é importante lutar para ser um intelectual, mas dar a impressão
de que se é um, mesmo a custa de títulos comparados e trabalhos forjados na
mais refinada técnica de “copia e cola”.
*Jornalista, cronista e poeta