Correi
grilos, gafanhotos e baratas. Ratos aguardem na fila; sua vez chegará. Cupins convocados
como prato, tipo arroz exótico, no banquete do fim dos tempos. Formigas, amigas
içás, tu que já és consumida em lautos acepipes da gente pobre acompanhada de farinha
seca, serás iguaria nos salinhas acanhadas da pequena realeza e entrarás pela
porta dos salões decadentes quando a fome adentrar nas portas. Moscas, não
pensem que escaparão.
É
chegada a hora de perder preconceitos, frescurites, nojos. É hora de ampliar o
cardápio de iguarias comestíveis. Os insetos são a última fronteira a ser
desbravada, e em larguíssima escala, pela população famélica do mundo. São eles,
nossos vizinhos, a maior população de seres vivos da terra. Penso, inclusive,
que eles é que realmente herdarão a terra. Eles são o sal, mas também o prato
principal a ser temperado.
O
brasileiro tem um paladar refinado. Por aqui, a não ser quando oriundo mesmo
que da classe baixa metida a besta, o indivíduo faz cara da nojo para um
apetitoso manjar de vísceras bovinas ou de cérebro de ovinos. A ralé, ao
contrário, vai de calango a guaxelo. Isso sem contar os gatos que dão o couro
pro tamborim e a carne pro espetinho. Uma performance alimentar digna de
chineses.
Esses
últimos, por sua vez, dão lição ao mundo ao aproveitar, lautamente, a farta
oferta de proteína dos insetos e carne de cachorros. Mas, também, eles tem em
mão uma equação difícil de resolver. Muitas bocas para alimentar, pouco espaço
de terra para suportar a multiplicação exponencial de vidas. Só poderia sobrar,
então, para insetos e cachorros.
Ouvir
de alguém certa vez (não lembro se um antropólogo, sociólogo ou historiador)
que nosso “refino”, deve-se a fartura de nossa terra e do próprio processo
histórico; onde não desponta uma guerra, por exemplo, que nos obrigasse a
experimentar a escassez extrema. E a escassez é mãe de todos os desatinos. É onde
o homem perde a pose e seu lado selvagem perde a compostura. Em assim sendo, vamos desfilando nosso preconceito
contra comidas exóticas, tipo carne de fuleco ou testículo bovino a milanesa.
Quando
a justiça discute a possibilidade de controlar a superpopulação desses simpáticos
e marrentos “irmãos” através do sacrifício, nada soa mais natural que a
proposta de uma missão sanitária contra a multiplicação dos insetos. E que
melhor destinação para esses indesejados tripulantes do árido planeta, senão a alimentar.
Uma destinação nobre para uma cruzada terminal. A civilização curte desbravar
fronteiras e dá a isso pomposo nome de evolução. Evolução, no controverso entender
do homem, é destruir o que está próximo. É chegada a hora então dos bichos
escrotos. Vai um prato a base de larva de aedes aegypt?
O
homem é lobo quando faminto, ou age lupinamente quando pode tripudiar por puro
oportunismo e divertimento. Em busca da sobrevivência ou tão somente para
manter-se em pé, ele precisa de energia para gastar em coisas prosaicas. Olhar
a vida alheia, falar mal da vizinhança, dar pitacos na vida de quem passa,
fornicar feito coelhos, produzir rebentos barrigudinhos para o “mundo” criar,
discutir sobre o que não entende, usar ares de sapiência e autoridade, instilar
preconceitos e até cuidar de hortas desnecessárias. Ou seja, para gente que
sobrevive escrotamente, nada melhor que bichos escrotos no banquete do fim dos
tempos.
por Edson de França